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quarta-feira, 17 de abril de 2024

Identificado o buraco negro estelar mais massivo da nossa Galáxia

Os astrônomos identificaram o buraco negro estelar mais massivo descoberto até à data na Via Láctea.


© ESO (oscilação de estrela devido ao buraco negro Gaia BH3)

A imagem mostra as órbitas da estrela (em azul) e do buraco negro (em vermelho), designado Gaia BH3, em torno do seu centro de massa comum. Este buraco negro foi detectado em dados da missão Gaia da Agência Espacial Europeia (ESA) através de um movimento de "oscilação" estranho que este objeto impõe à estrela companheira que o orbita. 

Foram utilizados dados do Very Large Telescope (VLT) do Observatório Europeu do Sul (ESO) e de outros observatórios terrestres para calcular que a massa deste buraco negro é 33 vezes superior à do Sol. 

Os buracos negros estelares formam-se a partir do colapso de estrelas de grande massa e os anteriormente identificados na Via Láctea são, em média, cerca de 10 vezes mais massivos que o Sol. O buraco negro estelar mais massivo que conhecíamos na nossa Galáxia, Cygnus X-1, atinge apenas 21 massas solares, o que torna esta nova observação de 33 massas solares algo verdadeiramente excepcional. 

Mas, este não é o buraco negro mais massivo existente na nossa Galáxia, este título pertence a Sagitário A*, o buraco negro supermassivo situado no centro da Via Láctea, que tem cerca de quatro milhões de vezes a massa do Sol. No entanto, este é o buraco negro de maior massa conhecido na Via Láctea que se formou a partir do colapso de uma estrela. 

Curiosamente, este buraco negro encontra-se também extremamente próximo de nós, a apenas 2.000 anos-luz de distância, na constelação da Águia, sendo o segundo buraco negro mais próximo da Terra que conhecemos. Denominado Gaia BH3 foi encontrado quando a equipe analisava as observações de Gaia em preparação para uma próxima publicação de dados. 

Para confirmar a descoberta, a colaboração Gaia utilizou dados de observatórios terrestres, incluindo o instrumento UVES (Ultraviolet and Visual Echelle Spectrograph) montado no VLT do ESO, no deserto chileno do Atacama. Estas observações revelaram propriedades chave da estrela companheira, que, juntamente com os dados de Gaia, permitiram aos astrônomos medir com precisão a massa de Gaia BH3. 

Os astrônomos tinham já encontrado buracos negros igualmente massivos fora da nossa Galáxia (utilizando um método de detecção diferente), tendo teorizado que estes objetos poderão ser formados a partir do colapso de estrelas cuja composição química apresente pouquíssimos elementos mais pesados que o hidrogênio e o hélio. 

Pensa-se que estas estrelas, pobres em metais, perdem menos massa ao longo da sua vida e, portanto, possuem mais matéria, o que dará origem, após a sua morte, a buracos negros de elevada massa. No entanto, e até agora, não existiam provas que ligassem diretamente estrelas pobres em metais a buracos negros de elevada massa. As estrelas em pares tendem a ter composições químicas semelhantes, o que significa que a companheira de BH3 contém pistas importantes sobre a estrela que colapsou e formou este buraco negro. 

Os dados do UVES mostraram que a companheira é uma estrela muito pobre em metais, o que sugere que a estrela que colapsou para formar o Gaia BH3 seria também pobre em metais, tal como previsto pela teoria.

A disponibilização antecipada dos dados permitirá que outros astrônomos comecem a estudar este buraco negro desde já, sem esperar pela publicação dos dados completos, prevista para finais de 2025, na melhor das hipóteses. Outras observações deste sistema poderão revelar mais sobre a sua história e sobre o próprio buraco negro. O instrumento GRAVITY montado no Interferômetro do VLT do ESO poderá ajudar na compreensão deste objeto, analisando, por exemplo, se este buraco negro está atraindo matéria da sua vizinhança.

Um artigo foi publicado no periódico Astronomy & Astrophysics.

Fonte: ESO

domingo, 14 de abril de 2024

Detectado um notável sinal de ondas gravitacionais

Em maio de 2023, pouco depois do início da quarta série de observações LIGO-Virgo-KAGRA, o detetor LIGO em Livingston observou um sinal de ondas gravitacionais resultante da colisão do que é muito provavelmente uma estrela de nêutrons com um objeto compacto que tem 2,5 a 4,5 vezes a massa do nosso Sol.

© K. Gill (ilustração de uma estrela de nêutrons)

As estrelas de nêutrons e os buracos negros são ambos objetos compactos, os remanescentes densos de explosões estelares massivas. O que torna este sinal, chamado GW230529, intrigante é a massa do objeto mais pesado. Está dentro de um possível intervalo de massa entre as estrelas de nêutrons mais pesadas conhecidas e os buracos negros mais leves. 

O sinal de ondas gravitacionais, por si só, não pode revelar a natureza deste objeto. Futuras detecções de eventos semelhantes, especialmente os acompanhados por explosões de radiação eletromagnética, poderão ser a chave para resolver este mistério cósmico.

Existe uma lacuna de massa entre as estrelas de nêutrons e os buracos negros.  Antes da detecção de ondas gravitacionais em 2015, as massas dos buracos negros de massa estelar eram determinadas principalmente através de observações de raios X, enquanto as massas das estrelas de nêutrons eram determinadas através de observações de rádio. 

As medições resultantes dividiam-se em dois intervalos distintos, com uma diferença entre eles de cerca de 2 a 5 vezes a massa do nosso Sol. Ao longo dos anos, um pequeno número de medições tem-se aproximado deste intervalo de massa, que continua a ser altamente debatido entre os astrofísicos. A análise do sinal GW230529 mostra que este provém da fusão de dois objetos compactos, um com uma massa entre 1,2 e 2,0 vezes a do nosso Sol e o outro com um pouco mais do dobro da massa. 

Embora o sinal das ondas gravitacionais não forneça informação suficiente para determinar com certeza se estes objetos compactos são estrelas de nêutrons ou buracos negros, parece provável que o objeto mais leve seja uma estrela de nêutrons e o objeto mais massivo um buraco negro. 

Os cientistas da Colaboração LIGO-Virgo-KAGRA estão confiantes de que o objeto mais massivo está dentro da lacuna de massa. As observações de ondas gravitacionais já forneceram quase 200 medições das massas de objetos compactos. Destas, apenas uma outra fusão pode ter envolvido um objeto compacto na lacuna de massa, o sinal GW190814 veio da fusão de um buraco negro com um objeto compacto que excede a massa das estrelas de nêutrons mais pesadas conhecidas e está, possivelmente, dentro deste intervalo de massa. A observação deste sistema tem implicações importantes tanto para as teorias da evolução dos binários como para os homólogos eletromagnéticos das fusões de objetos compactos. 

A terceira série de observações dos detectores de ondas gravitacionais, muito bem-sucedida, terminou na primavera de 2020, elevando para 90 o número de detecções de ondas gravitacionais conhecidas. Antes do início da quarta série de observação, O4, em 24 de maio de 2023, os pesquisadores do LIGO-Virgo-KAGRA introduziram melhorias nos detectores, na infraestrutura e no software de análise que lhes permitem detectar sinais de mais longe e extrair mais informações sobre os eventos extremos em que as ondas são geradas. 

No dia 29 de maio de 2023, o sinal de ondas gravitacionais GW230529 passou pelo detector LIGO em Livingston. Em poucos minutos, os dados do detector foram analisados e foi emitido um alerta (designado S230529ay) anunciando publicamente o sinal. Os astrônomos que receberam o alerta foram informados de que uma estrela de nêutrons e um buraco negro se fundiram muito provavelmente a cerca de 650 milhões de anos-luz da Terra. Infelizmente, a direção da fonte não pôde ser determinada porque apenas um detector de ondas gravitacionais estava observando no momento do sinal. 

A quarta série de observações está planejada para durar 20 meses, incluindo uma pausa de dois meses para realizar a manutenção dos detectores e para fazer uma série de melhorias necessárias. Até 16 de janeiro de 2024, quando começou a pausa de comissionamento, tinham sido identificados um total de 81 candidatos a sinais significativos. GW230529 é o primeiro destes a ser publicado após uma investigação pormenorizada. A quarta série de observações foi retomada no passado dia 10 de abril de 2024 com os detectores LIGO em Hanford, LIGO em Livingston e Virgo funcionando em conjunto. A série continuará até fevereiro de 2025, cujo número total de sinais de ondas gravitacionais observados deverá ultrapassar os 200.

Fonte: Max Planck Institute for Gravitational Physics

sábado, 6 de abril de 2024

Novo comportamento de buraco negro em galáxia distante

No núcleo de uma galáxia longínqua, um buraco negro supermassivo parece ter tido um caso de "soluços".

© P. Sukova (simulação de um buraco negro liberando plumas de gás)

Astrônomos do MIT (Massachusetts Institute of Technology) e de outros países descobriram que um buraco negro anteriormente calmo, que se situa no centro de uma galáxia a cerca de 800 milhões de anos-luz de distância, entrou subitamente em erupção, liberando plumas de gás a cada 8,5 dias antes de voltar ao seu estado normal e calmo. 

Os soluços periódicos são um novo comportamento que até agora não tinha sido observado em buracos negros. Os cientistas pensam que a explicação mais provável para os surtos provém de um segundo buraco negro menor que está a girando em torno do buraco negro supermassivo central e lançando material do disco de gás do buraco negro maior a cada 8,5 dias. 

As descobertas desafiam a imagem convencional dos discos de acreção dos buracos negros, que os cientistas supunham serem discos de gás relativamente uniformes. Os novos resultados sugerem que os discos de acreção podem ser mais variados no seu conteúdo, possivelmente contendo outros buracos negros e até estrelas inteiras.

As descobertas resultaram de uma detceção automática pelo ASAS-SN (All Sky Automated Survey for SuperNovae), uma rede de 20 telescópios robóticos situados em vários locais dos hemisférios norte e sul. Os telescópios fazem um levantamento automático de todo o céu, uma vez por dia, em busca de sinais de supernovas e outros fenômenos transientes. Em dezembro de 2020, o levantamento detectou uma explosão de luz numa galáxia a cerca de 800 milhões de anos-luz de distância. Essa parte específica do céu tinha estado relativamente calma e escura até à detecção pelos telescópios, quando a galáxia subitamente se iluminou por um fator de 1000.

Logo após, a erupção foi focada com o NICER (Neutron star Interior Composition Explorer) da NASA, um telescópio de raios X a bordo da Estação Espacial Internacional que monitora continuamente o céu em busca de explosões de raios X que possam assinalar atividade de estrelas de nêutrons, buracos negros e outros fenômenos gravitacionais extremos. 

A explosão durou cerca de quatro meses antes de se extinguir. Notou-se um padrão curioso na erupção: quedas sutis, numa banda muito estreita de raios X, cuja explosão de energia oriunda da galáxia diminuía periodicamente a cada 8,5 dias. O sinal é semelhante quando um planeta em órbita passa em frente da sua estrela hospedeira, bloqueando brevemente a luz da estrela. Mas nenhuma estrela seria capaz de bloquear uma erupção de uma galáxia inteira.

Isso poderia ser explicado, se um buraco negro supermassivo central de uma galáxia abrigasse um segundo buraco negro muito menor. Esse buraco negro menor poderia orbitar a um ângulo do disco de acreção do seu companheiro maior. O buraco negro secundário perfuraria periodicamente o disco do buraco negro primário à medida que orbitasse. No processo, liberaria uma pluma de gás.

Especificamente, a equipe descobriu que a galáxia estava relativamente calma antes da detecção de dezembro de 2020. Estima-se que o buraco negro supermassivo central da galáxia tenha uma massa equivalente a 50 milhões de sóis. Antes da explosão, o buraco negro pode ter tido um disco de acreção tênue e difuso ao seu redor, enquanto um segundo buraco negro menor, com 100 a 10.000 massas solares, orbitava em relativa obscuridade. Os pesquisadores suspeitam que, em dezembro de 2020, um terceiro objeto, provavelmente uma estrela, se aproximou demasiado do sistema e foi dilacerada pela imensa gravidade do buraco negro supermassivo, um evento denominado "evento de perturbação de marés". 

O súbito fluxo de material estelar iluminou momentaneamente o disco de acreção do buraco negro, à medida que os detritos estelares se precipitavam no buraco negro. Ao longo de quatro meses, o buraco negro alimentou-se dos detritos enquanto o segundo buraco negro continuava orbitando. Ao perfurar o disco, ejetava uma pluma muito maior do que normalmente faria, que por acaso foi liberada diretamente na direção do telescópio NICER. 

Este resultado mostra que binários de buracos negros supermassivos muito íntimos podem ser comuns nos núcleos galácticos, o que é um desenvolvimento muito excitante para futuros detectores de ondas gravitacionais. 

Um artigo foi publicado na revista Science Advances.

Fonte: Massachusetts Institute of Technology

sexta-feira, 8 de março de 2024

Encontrado o par de buracos negros mais massivo no Universo

Utilizando dados de arquivo do telescópio Gemini Norte, uma equipe de astrônomos mediu o par de buracos negros supermassivos mais pesado alguma vez encontrado.

© NOIRLab (ilustração da fusão de dois buracos negros)

A fusão de dois buracos negros supermassivos é um fenômeno há muito previsto, mas nunca observado. Este par massivo dá pistas sobre a razão pela qual um tal acontecimento parece tão improvável no Universo. 

Quase todas as galáxias massivas abrigam um buraco negro supermassivo no seu centro. Quando duas galáxias se fundem, os seus buracos negros podem formar um par binário, o que significa que se orbitam um ao outro. Teoriza-se que estes binários estão destinados a fundir-se, mas tal nunca foi observado. A questão de saber se tal acontecimento é possível tem sido um tópico de discussão entre os astrônomos durante décadas. 

Astrônomos apresentaram uma nova perspectiva sobre esta questão. Eles utilizaram dados do telescópio Gemini Norte no Havaí, uma metade do Observatório Gemini operado pelo NOIRLab (National Optical-Infrared Astronomy Research Laboratory), para analisar um buraco negro binário supermassivo localizado na galáxia elíptica B2 0402+379.

Este é o único buraco negro binário supermassivo alguma vez resolvido com detalhe suficiente para ver ambos os objetos separadamente (já foram feitas observações anteriores de galáxias contendo dois buracos negros supermassivos, mas nesses casos estão separados por milhares de anos-luz, demasiado longe para se orbitarem um ao outro) e detém o recorde de ter a menor separação alguma vez medida diretamente, apenas 24 anos-luz (existem outras fontes idênticas com, possivelmente, separações menores, mas foram apenas inferidas usando observações indiretas e portanto só podem ser classificados como candidatos a binário). 

Embora esta separação próxima prenuncie uma fusão poderosa, outros estudos revelaram que o par está "parado" a esta distância há mais de três bilhões de anos, o que levanta a questão: porquê a demora? 

Para compreender melhor a dinâmica deste sistema e a sua fusão "interrompida", os astrônomos recorreram a dados de arquivo do instrumento GMOS (Gemini Multi-Object Spectrograph), que lhes permitiu determinar a velocidade das estrelas na vizinhança dos buracos negros e inferir a massa total dos buracos negros que lá residem.

A equipe estima que a massa do binário seja 28 bilhões de vezes superior à do Sol, o que faz do par o buraco negro binário mais massivo alguma vez medido. Esta medição não só fornece um contexto valioso para a formação do sistema binário e para a história da sua galáxia hospedeira, como também apoia a teoria de longa data de que a massa de um buraco negro binário supermassivo desempenha um papel fundamental no bloqueio de uma potencial fusão (esta teoria foi apresentada pela primeira vez em 1980 por Begelman et al. e há muito que se defende a sua ocorrência com base em décadas de observações dos centros das galáxias). 

Compreender como é que este binário se formou pode ajudar a prever se e quando se irá fundir; e algumas pistas apontam para que o par se tenha formado através de múltiplas fusões de galáxias. A primeira é que B2 0402+379 é um "aglomerado fóssil", o que significa que é o resultado da fusão de estrelas e gás de todo um aglomerado de galáxias numa única galáxia massiva. Além disso, a presença de dois buracos negros supermassivos, juntamente com a sua grande massa combinada, sugere que resultaram da fusão de vários buracos negros mmenores de várias galáxias. 

Após uma fusão de galáxias, os buracos negros supermassivos não colidem de frente. Em vez disso, começam a passar uns pelos outros à medida que se estabelecem numa órbita. Com cada passagem que fazem, a energia é transferida dos buracos negros para as estrelas que os rodeiam. À medida que perdem energia, o par é arrastado para cada vez mais perto, até ficarem a apenas alguns anos-luz de distância, momento em que a radiação gravitacional assume o controle e se fundem.

Este processo foi observado diretamente em pares de buracos negros de massa estelar, o primeiro caso registado foi em 2015, através da detecção de ondas gravitacionais, mas nunca num binário da variedade supermassiva. 

Com o novo conhecimento da massa extremamente elevada do sistema, a equipe concluiu que teria sido necessário um número excepcionalmente grande de estrelas para abrandar a órbita do binário o suficiente para os aproximar tanto. No processo, os buracos negros parecem ter expelido quase toda a matéria na sua vizinhança, deixando o núcleo da galáxia sem estrelas e sem gás. Sem mais matéria disponível para abrandar ainda mais a órbita do par, a fusão estagnou na sua fase final.

Normalmente, parece que as galáxias com pares de buracos negros mais leves têm estrelas e massa suficientes para os juntar rapidamente. Uma vez que este par é tão pesado, eram necessárias muitas estrelas e gás para o fazer. Mas o binário retirou essa matéria da galáxia central, deixando-a estagnada.

Ainda não se sabe se o par vai ultrapassar a sua estagnação e acabar por se fundir em escalas de tempo de milhões de anos, ou se vai continuar no limbo orbital para sempre. Se se fundirem, as ondas gravitacionais resultantes serão cem milhões de vezes mais poderosas do que as produzidas pela fusão de buracos negros de massa estelar. É possível que o par conquiste a distância final através de outra fusão de galáxias, que injetaria no sistema material adicional, ou potencialmente um terceiro buraco negro, para abrandar a órbita do par o suficiente para se fundir. 

No entanto, dado o estatuto de B2 0402+379 como aglomerado fóssil, outra fusão de galáxias é improvável. O acompanhamento do núcleo de B2 0402+379 e análise da quantidade de gás presente fornecerá mais informações sobre se os buracos negros supermassivos podem eventualmente fundir-se ou se ficarão presos como binários.

Um artigo foi publicado no periódico The Astrophysical Journal.

Fonte: Gemini Observatory

segunda-feira, 26 de fevereiro de 2024

Buraco negro cria contas estelares em um cordão

Os astrônomos descobriram uma das mais poderosas erupções de um buraco negro alguma vez registrada.

© Chandra / LOFAR / Hubble (aglomerado de galáxias SDSS J1531)

Esta megaexplosão, ocorrida há bilhões de anos, pode ajudar a explicar a formação de um impressionante padrão de aglomerados de estrelas em torno de duas galáxias massivas, semelhante a contas num cordão. 

Esta descoberta foi feita no sistema conhecido como SDSS J1531+3414 (SDSS J1531 para abreviar), que se situa a 3,8 bilhões de anos-luz da Terra. Para este estudo foram utilizados vários telescópios, incluindo o observatório de raios X Chandra da NASA e o radiotelescópio LOFAR (Low Frequency Array). 

O  SDSS J1531 é um enorme aglomerado de galáxias que contém centenas de galáxias individuais e enormes reservatórios de gás quente e matéria escura. No coração de SDSS J1531, duas das maiores galáxias do aglomerado estão colidindo uma com a outra. Ao redor destas galáxias gigantes em fusão está um conjunto de 19 grandes aglomerados estelares, chamados superaglomerados, dispostos numa formação em "S" que se assemelha a contas num cordão. 

Uma equipe de astrônomos utilizou dados de raios X, no rádio e no visível para desvendar a provável formação desta cadeia incomum de aglomerados de estrelas. A descoberta de evidências de uma antiga e titânica erupção em SDSS J1531 forneceu uma pista vital. A erupção terá ocorrido quando o buraco negro supermassivo no centro de uma das grandes galáxias produziu um jato extremamente poderoso. À medida que o jato se deslocava pelo espaço, empurrou o gás quente circundante para longe do buraco negro, criando uma cavidade gigantesca.

A prova da existência de uma cavidade provém de "asas" de emissão brilhante em raios X, observadas com o Chandra, que traçam o gás denso perto do centro de SDSS J1531. Estas asas constituem a orla da cavidade e o gás menos denso no meio faz parte da cavidade. O LOFAR mostra ondas de rádio provenientes dos remanescentes das partículas energéticas do jato que preenchem a cavidade gigante. Em conjunto, estes dados fornecem evidências convincentes de uma explosão antiga e massiva. 

Os astrônomos também descobriram gás frio e ameno localizado perto da abertura da cavidade, detectado com o ALMA (Atacama Large Millimeter and submillimeter Array) e com o telescópio Gemini Norte, respectivamente. Os pesquisadores argumentam que parte do gás quente empurrado para longe do buraco negro acabou por arrefecer, formando gás frio e ameno. A equipe pensa que os efeitos de maré das duas galáxias em fusão comprimiram o gás ao longo de trajetórias curvas, levando à formação de aglomerados estelares com o padrão "contas num cordão". 

Os astrônomos reconstruíram neste aglomerado uma sequência provável de eventos que ocorreram ao longo de uma vasta variabilidade de distâncias e tempo. Começou com o buraco negro, com uma pequena fração de um ano-luz de diâmetro, formando uma cavidade com quase 500.000 anos-luz de largura. Este acontecimento único desencadeou a formação dos jovens aglomerados estelares cerca de 200 milhões de anos mais tarde, cada um com alguns milhares de anos-luz de diâmetro.

Os astrônomos apenas observaram ondas de rádio e uma cavidade de um jato, mas os buracos negros normalmente disparam dois jatos em direções opostas. A equipe observou emissões de rádio mais longe das galáxias que podem ser os remanescentes de um segundo jato, mas não estão associadas a uma cavidade detectada. Supõe-se que os sinais de rádio e de raios X da outra erupção podem ter desvanecido ao ponto de não serem detectáveis.

Um artigo foi publicado no periódico The Astrophysical Journal

Fonte: Harvard-Smithsonian Center for Astrophysics

sexta-feira, 23 de fevereiro de 2024

Descoberto o quasar mais brilhante e com maior crescimento

Com o auxílio do Very Large Telescope (VLT) do Observatório Europeu do Sul (ESO), os astrônomos caracterizaram um quasar brilhante, descobrindo que é não só o mais brilhante do seu tipo, mas também o objeto mais luminoso alguma vez observado.

© ESO (ilustração do quasar mais brilhante)

Os quasares são os núcleos brilhantes de galáxias distantes, alimentados por buracos negros supermassivos. O buraco negro deste quasar recordista está crescendo em massa o equivalente a um Sol por dia, o que faz dele o buraco negro com o crescimento mais rápido descoberto até à data. 

Os buracos negros que alimentam os quasares retiram matéria do meio que os rodeia por um processo tão energético que faz com que o objeto emita enormes quantidades de luz. É por isso que os quasares são dos objetos mais brilhantes do nosso céu, sendo que mesmo os mais distantes são visíveis a partir da Terra. Regra geral, os quasares mais luminosos indicam os buracos negros supermassivos com o mais rápido crescimento.

O quasar, chamado J0529-4351, tem uma massa de 17 bilhões de sóis, chamado J0529-4351, está tão longe da Terra que a sua luz demorou mais de 12 bilhões de anos para chegar até nós. A matéria que está sendo puxada em direção ao buraco negro, sob a forma de um disco, emite tanta energia que faz com que o quasar seja mais de 500 trilhões de vezes mais luminoso do que o Sol. Toda essa luz vem de um disco de acreção quente que mede sete anos-luz de diâmetro (correspondem a cerca de 15.000 vezes a distância do Sol à órbita de Netuno); este deve ser o maior disco de acreção do Universo.

Há alguns anos, a NASA e a ESA (Agência Espacial Europeia) divulgaram uma notícia que dizia que o telescópio espacial Hubble tinha descoberto um quasar, J043947.08+163415.7, tão brilhante como 600 trilhões de sóis. No entanto, o brilho desse quasar estava sendo ampliado por uma lente gravitacional, na forma de uma galáxia localizada entre nós e o quasar longínquo. Estima-se que a luminosidade real de J043947.08+163415.7 seja equivalente a cerca de 11 trilhões de sóis.

O quasar aparecia já em imagens do ESO Schmidt Southern Sky Survey datadas de 1980, mas que só foi reconhecido como sendo um quasar décadas mais tarde. Encontrar quasares requer dados observacionais precisos de grandes áreas do céu. As bases de dados resultantes deste tipo de observações são tão extensas que os pesquisadores utilizam frequentemente modelos de aprendizagem de máquina para as analisar e distinguir os quasares de outros objetos celestes. No entanto, estes modelos são treinados com base em dados existentes, o que limita os potenciais candidatos a quasares a serem identificados como objetos semelhantes aos que já conhecemos. Se um novo quasar for mais luminoso do que qualquer outro anteriormente observado, o programa pode rejeitá-lo e classificá-lo simplesmente como sendo uma estrela próxima da Terra.

Uma análise dos dados do satélite Gaia, da ESA, rejeitou o J0529-4351 como sendo um quasar por este ser demasiado brilhante, sugerindo antes que se tratava de uma estrela. Os astrônomos identificaram-no como um quasar distante apenas o ano passado, utilizando observações do telescópio de 2,3 metros da Australian National University (ANU), instalado no Observatório de Siding Spring, na Austrália. 

No entanto, para descobrir que se tratava do quasar mais luminoso alguma vez observado, foi necessário um telescópio maior e medições efetuadas por um instrumento mais preciso. O espectrógrafo X-shooter do VLT do ESO, situado no deserto chileno do Atacama, forneceu os dados cruciais. O buraco negro de crescimento mais rápido alguma vez observado será também um alvo perfeito para a atualização do GRAVITY+ montado no Interferômetro do VLT (VLTI) do ESO, que foi concebido para medir com precisão a massa dos buracos negros, incluindo os que se encontram a grande distância da Terra. Adicionalmente, o Extremely Large Telescope (ELT) do ESO, um telescópio de 39 metros em construção também no deserto chileno do Atacama, tornará ainda mais viável a identificação e caracterização destes objetos elusivos. 

A descoberta e o estudo de buracos negros supermassivos distantes poderá esclarecer alguns dos mistérios do Universo primordial, incluindo a forma como estes e as suas galáxias hospedeiras se formaram e evoluíram.

Um artigo foi publicado na revista Nature Astronomy

Fonte: ESO

quarta-feira, 14 de fevereiro de 2024

O que veio primeiro: buracos negros ou galáxias?

Os buracos negros não só existiram no início dos tempos, como também deram origem a novas estrelas e impulsionaram a formação de galáxias, sugere uma nova análise de dados do telescópio espacial James Webb.

© JHU / R. Candanosa (campo magnético gerado por um buraco negro)

Esta descoberta vem alterar as teorias sobre a forma como os buracos negros moldam o cosmos, desafiando a ideia clássica de que se formaram após o aparecimento das primeiras estrelas e galáxias. Ao invés, os buracos negros podem ter acelerado drasticamente o nascimento de novas estrelas durante os primeiros 50 milhões de anos do Universo, um período fugaz dos seus 13,8 bilhões de anos de história.

As galáxias distantes do Universo primitivo, observadas através do telescópio espacial James Webb, parecem muito mais brilhantes do que os cientistas previram e revelam um número anormalmente elevado de estrelas jovens e buracos negros supermassivos. O conhecimento convencional sustenta que os buracos negros se formaram após o colapso de estrelas supermassivas e que as galáxias se formaram após as primeiras estrelas terem iluminado o escuro Universo primitivo. Mas a análise atual sugere que os buracos negros e as galáxias coexistiram e influenciaram o destino uns dos outros durante os primeiros 100 milhões de anos.  

Os pesquisadores argumentam que os fluxos dos buracos negros esmagaram nuvens de gás, transformando-as em estrelas e acelerando em muito o ritmo de formação estelar. Caso contrário, é muito difícil compreender de onde vieram estas galáxias brilhantes, porque são tipicamente menores no Universo primitivo. 

Por que razão estariam formando estrelas tão depressa? Os buracos negros são regiões no espaço onde a gravidade é tão forte que nada pode escapar à sua atração, nem mesmo a luz. Devido a esta força, geram campos magnéticos poderosos que provocam tempestades violentas, ejetando plasma turbulento e agindo como enormes aceleradores de partículas. Este processo é provavelmente a razão pela qual os detectores do telescópio Webb avistaram mais buracos negros e galáxias brilhantes do que os cientistas previam.

Não é possível ver estes ventos violentos ou jatos muito longínquos, mas devem estar presentes porque são observados muitos buracos negros no início do Universo. Estes ventos enormes provenientes dos buracos negros esmagam nuvens de gás próximas e transformam-nas em estrelas. Este é o elo que faltava para explicar porque é que estas primeiras galáxias são muito mais brilhantes do que era esperado. 

A equipe prevê que o Universo jovem teve duas fases. Durante a primeira fase, os fluxos altamente velozes dos buracos negros aceleraram a formação de estrelas, e depois, numa segunda fase, os fluxos abrandaram. Algumas centenas de milhões de anos após o Big Bang, as nuvens de gás entraram em colapso devido a tempestades magnéticas dos buracos negros supermassivos, e nasceram novas estrelas a um ritmo muito superior ao observado bilhões de anos mais tarde em galáxias normais. A criação de estrelas abrandou porque estes fluxos poderosos passaram para um estado de conservação de energia reduzindo o gás disponível para formar estrelas nas galáxias.

A equipe espera que as futuras observações do telescópio Webb, com contagens mais precisas de estrelas e buracos negros supermassivos no Universo primitivo, ajudem a confirmar os seus cálculos.

Um artigo foi publicado no periódico The Astrophysical Journal Letters

Fonte: Johns Hopkins University

O buraco negro da Via Láctea está pronto para bater o pênalti

Segundo um novo estudo que utiliza dados do observatório de raios X Chandra da NASA e do VLA (Karl G. Jansky Very Large Array), o buraco negro supermassivo no centro da Via Láctea está girando tão depressa que está deformando o espaço-tempo à sua volta, dando-lhe uma forma que pode parecer uma bola de futebol americano.

© EHT (Sagittarius A)

Este buraco negro gigante é o Sagitário A* (Sgr A*), que se encontra a cerca de 26.000 anos-luz de distância da Terra, no centro da nossa Galáxia. 

Os buracos negros têm duas propriedades fundamentais: a sua massa e a sua rotação. A determinação de qualquer um destes dois valores diz muito sobre o comportamento de qualquer buraco negro. 

Pesquisadores aplicaram um novo método que utiliza dados de raios X e rádio para determinar a velocidade de rotação de Sgr A* com base na forma como o material flui em direção ao buraco negro e se afasta dele. Descobriram que Sgr A* está girando com uma velocidade angular que é cerca de 60% do valor máximo possível, um limite estabelecido pelo fato da matéria não poder viajar mais depressa do que a velocidade da luz.

No passado, astrônomos fizeram várias outras estimativas da velocidade de rotação de Sgr A* utilizando outras técnicas, com resultados que variaram entre não girar na totalidade e girar quase à velocidade máxima. 

Um buraco negro em rotação puxa o espaço-tempo e a matéria próxima à sua volta enquanto gira. O espaço-tempo ao redor do buraco negro em rotação é também esmagado. Olhando para um buraco negro de cima para baixo, ao longo de qualquer jato que produza, o espaço-tempo tem uma forma circular. No entanto, olhando para o buraco negro girando de lado, o espaço-tempo tem a forma de uma bola de futebol americano. Quanto mais rápida a rotação, mais achatada é a bola. 

A rotação de um buraco negro pode atuar como uma importante fonte de energia. Os buracos negros supermassivos em rotação podem produzir fluxos colimados, ou seja, feixes estreitos de matéria, como jatos, quando a sua energia rotacional é extraída, o que exige que exista pelo menos alguma matéria na vizinhança do buraco negro. Devido ao combustível limitado em torno de Sgr A*, este buraco negro tem estado relativamente calmo nos últimos milênios, com jatos relativamente fracos. No entanto, este trabalho mostra que isto pode mudar se a quantidade de matéria na vizinhança de Sgr A* aumentar. 

Isto significa que, no futuro, se as propriedades da matéria e a intensidade do campo magnético próximo do buraco negro se alterarem, parte da enorme energia rotacional do buraco negro poderá impulsionar fluxos mais fortes. Esta fonte de matéria pode vir do gás ou dos remanescentes de uma estrela despedaçada pela gravidade do buraco negro, caso esta estrela se aproxime demasiado de Sgr A*.

Os jatos alimentados e colimados pelo buraco negro central de uma galáxia podem afetar profundamente o fornecimento de gás a uma galáxia inteira, o que afeta a rapidez com que as estrelas se podem formar. 

As "bolhas de Fermi" observadas em raios X e raios gama em torno do buraco negro da Via Láctea mostram que Sgr A* esteve provavelmente ativo no passado. A medição da rotação do buraco negro é um teste importante deste cenário. Para determinar a rotação de Sgr A*, foi utilizado um método teórico empírico, referido como "método do fluxo", que detalha a relação entre a rotação do buraco negro e a sua massa, as propriedades da matéria perto do buraco negro e as propriedades do fluxo. O fluxo colimado produz as ondas de rádio, enquanto o disco de gás que rodeia o buraco negro é responsável pela emissão de raios X. Usando este método, os pesquisadores combinaram os dados do Chandra e do VLA com uma estimativa independente da massa do buraco negro, obtida por outros telescópios, para restringir a rotação de Sgr A*. 

Embora ele esteja calmo neste momento, no futuro, dará um chute incrivelmente poderoso na matéria circundante. Isto pode acontecer daqui a mil ou um milhão de anos, ou pode acontecer ainda durante a nossa vida.

Um artigo foi publicado no periódico Monthly Notices of the Royal Astronomical Society.

Fonte: Harvard-Smithsonian Center for Astrophysics

sexta-feira, 2 de fevereiro de 2024

"Pesando" um buraco negro no Universo primordial

Com o atualizado instrumento GRAVITY do VLTI (Very Large Telescope Interferometer) do ESO, uma equipe de astrônomos liderada pelo Instituto Max Planck de Física Extraterrestre determinou a massa de um buraco negro numa galáxia apenas 2 bilhões de anos após o Big Bang.

© Cosmonovas (ilustração de um buraco negro)

Com 300 milhões de massas solares, o buraco negro é pouco massivo em comparação com a massa da sua galáxia hospedeira. 

No Universo mais local, os astrônomos observaram relações íntimas entre as propriedades das galáxias e a massa dos buracos negros supermassivos que residem nos seus centros, sugerindo que as galáxias e os buracos negros coevoluem. Um teste crucial seria sondar esta relação nos primeiros tempos do cosmos, mas para estas galáxias longínquas os tradicionais métodos diretos de medição da massa do buraco negro são impossíveis ou extremamente difíceis. 

Apesar destas galáxias brilharem frequentemente com muita intensidade, denominadas quasares quando descobertas na década de 1950, estão tão distantes que não podem ser detectadas pela maioria dos telescópios.

Em 2018, foram efetuadas as primeiras medições inovadoras da massa de um buraco negro de um quasar com o GRAVITY. No entanto, este quasar estava muito próximo. Agora, foi atingido um desvio para o vermelho de 2,3, o que corresponde a observar 11 bilhões de anos para trás no tempo. O GRAVITY+ abre agora um caminho novo e preciso para estudar o crescimento dos buracos negros nesta época crítica, frequentemente designada por "meio-dia cósmico", quando tanto os buracos negros como as galáxias estavam crescendo rapidamente. 

Atulamente é possível obter imagens de buracos negros no Universo inicial, 40 vezes mais nítidas do que é obtido com o telescópio espacial James Webb. O GRAVITY combina interferometricamente os quatro telescópios de 8 metros do VLT do ESO, criando essencialmente um telescópio virtual gigante com um diâmetro de 130 metros. 

A equipa foi capaz de resolver espacialmente o movimento das nuvens de gás em torno do buraco negro central da galáxia SDSS J092034.17+065718.0, à medida que giram num disco espesso. Isto permite uma medição direta da massa do buraco negro. Com 320 milhões de massas solares, a massa do buraco negro é inferior à da galáxia que o acolhe, que tem uma massa de cerca de 600 bilhões de massas solares. Este fato sugere que a galáxia hospedeira cresceu mais depressa do que o buraco negro supermassivo, indicando, em alguns sistemas, um atraso entre o crescimento da galáxia e o do buraco negro.

O cenário provável para a evolução desta galáxia parece ser uma forte atividade de supernova, no qual estas explosões estelares expulsam o gás das regiões centrais antes que este possa atingir o buraco negro no centro galáctico. O buraco negro só pode começar a crescer rapidamente e a acompanhar o crescimento global da galáxia quando a galáxia se tiver tornado suficientemente massiva para reter um reservatório de gás nas suas regiões centrais, mesmo contra a atividade de supernova.

Para determinar se este cenário é também o modo dominante da coevolução de outras galáxias e dos seus buracos negros centrais, a equipe vai fazer um acompanhamento com mais medições altamente precisas da massa de buracos negros no Universo primitivo.

Um artigo foi publicado na revista Nature

Fonte: Max Planck Institute for Extraterrestrial Physics

segunda-feira, 29 de janeiro de 2024

A rotação e a massa dos buracos negros binários estão correlacionados?

Quando os pesquisadores analisam as detecções de buracos negros em fusão feitas por observatórios de ondas gravitacionais, utilizam modelos e estatísticas para fazer inferências cuidadosas acerca da população de buracos negros no nosso Universo.

© R. Hurt (ilustração da fusão de dois buracos negros)

Os astrônomos exploraram se uma tendência emergente nos dados de ondas gravitacionais é real ou um artefato de anteriores métodos de análise. A detecção, em 2015, de ondas gravitacionais provenientes da fusão de buracos negros pelo LIGO (Laser Interferometer Gravitational-Wave Observatory), deu aos cientistas uma nova forma de explorar os buracos negros. Ao analisar as ondulações no espaço-tempo resultantes da colisão de buracos negros, os pesquisadores esperam compreender como é que estes objetos se formaram (através do colapso de estrelas massivas ou de fusões sucessivas de buracos negros já existentes?) e como é que vieram a existir em sistemas binários (por pertencerem primeiro a um sistema binário estelar ou por se formarem sozinhos e se ligarem a outro buraco negro mais tarde?). 

Um resultado potencial que surgiu das várias análises de sinais de ondas gravitacionais é que as rotações efetivas e proporção das massas de buracos negros binários em fusão parecem estar correlacionados. Mas, tal como acontece com todos os resultados que são extraídos estatisticamente de conjuntos complexos de dados, é importante perguntar se esta é uma característica real dos dados, com implicações reais para a forma como os buracos negros binários são "montados", ou se é um resultado dos modelos ou das análises estatísticas.

Um novo tratamento estatístico foi aplicado às detecções de fusões de buracos negros. Este tratamento apresenta um novo modelo para a rotação efetiva e permite a existência de uma subpopulação de buracos negros binários com rotação efetiva nula, que ainda não foi descartada e que pode ter um impacto ainda não considerado. A equipe aplicou o seu modelo populacional ao terceiro catálogo de sinais de ondas gravitacionais dos detectores LIGO e Virgo e utilizou métodos estatísticos Bayesianos para extrair as propriedades da população global de buracos negros. 

Descobriram que a correlação anteriormente relatada entre a rotação efetiva e a proporção de massa é provavelmente real, descartando a possibilidade de não haver correlação com uma probabilidade de 99,7%. Uma possibilidade que persiste é que este resultado se deve ao paradoxo de amalgamação, que surge quando as tendências presentes em diferentes fatores desaparecem ou se invertem quando eles são tidos em conjunto. Se a correlação observada resistir a um exame estatístico mais aprofundado, vários fenômenos astrofísicos poderão ser responsáveis por este efeito: a grande transferência de massa entre estrelas progenitoras de buracos negros, estrelas que evoluem dentro de um invólucro comum e que acretam matéria a um ritmo elevado, ou mesmo sistemas de buracos negros binários situados dentro dos discos de acreção de NGAs (núcleos galácticos ativos), fenômenos estes que devem ser todos investigados com os futuros modelos da população de buracos negros. 

Um artigo foi publicado no periódico The Astrophysical Journal

Fonte: American Astronomical Society

quarta-feira, 24 de janeiro de 2024

Descoberta a estrela de nêutrons mais massiva?

Quando os astrônomos não conseguem explicar algo diretamente, muitas vezes torna-se verdadeiramente excitante.

© D. Futselaar (ilustração de um pulsar e um buraco negro)

Uma equipe internacional liderada por pesquisadores do Instituto Max Planck de Radioastronomia e com a participação do Instituto Max Planck de Física Gravitacional descobriu agora um misterioso par que nunca tinha sido observado antes: um sistema constituído por uma estrela de nêutrons e um objeto que, à primeira vista, nem sequer deveria existir. Mas existem pistas importantes. 

Os pesquisadores da colaboração internacional TRAPUM (Transients and Pulsars with MeerKAT) descobriram um novo sistema constituído por dois objetos, localizado no aglomerado globular NGC 1851, na direção da constelação austral de Columba (Pomba). Os dois objetos têm muito provavelmente uma coisa em comum: ambos devem ter surgido, embora indiretamente, dos remanescentes de estrelas massivas, ou seja, de estrelas de nêutrons ou de buracos negros. 

As estrelas massivas formam-se frequentemente em sistemas estelares múltiplos. E são precisamente estas estrelas que, no final das suas vidas, morrem numa espetacular explosão de supernova. Os remanescentes: buracos negros ou estrelas de nêutrons que se orbitam uns aos outros, caso o sistema tenha sobrevivido à explosão. 

Até agora, só foram detectados pares de buracos negros e estrelas de nêutrons graças às ondas gravitacionais que emitem durante a sua dança íntima. É conhecida a natureza de pelo menos um dos dois objetos. A equipe utilizou o sensível radiotelescópio MeerKAT, na África do Sul, em combinação com poderosos detectores do Instituto Max Planck de Radioastronomia, e registrou pulsos fracos. 

Trata-se de uma estrela de nêutrons com um forte campo magnético que gira muito rapidamente, emitindo ondas de rádio ao longo de cones de luz opostos que varrem o Universo como um farol cósmico. O pulsar recentemente descoberto, de nome PSR J0514-4002E, gira em torno do seu próprio eixo mais de 170 vezes por segundo e a sua luz rádio atinge a Terra com a mesma frequência. A cada rotação, o radiotelescópio regista um pulso, semelhante ao tique-taque de um relógio. O pulsar tem um ritmo extremamente regular. 

Foram utilizados pequenos desvios ou diferenças no ritmo deste "relógio" para obter detalhes sobre uma companheira que orbita num centro de gravidade comum, juntamente com o pulsar. O efeito Doppler faz com que a frequência de rádio do pulsar se altere como resultado do seu movimento orbital, tal como o som da sirene de um carro de bombeiros ao passar pelo observador. Isto também permitiu determinar a órbita do pulsar em torno do objeto misterioso.

A situação é menos clara quando se trata do objeto companheiro que orbita o pulsar. Quando observa-se as imagens de NGC 1851 obtidas pelo telescópio espacial Hubble, não é visto nada nessa posição. Por isso, o objeto em órbita com o pulsar não é uma estrela normal, mas um remanescente extremamente denso de uma estrela colapsada. Se este objeto fosse também uma estrela, emitiria, tal como o Sol, um vento estelar, que o cone de luz rádio do pulsar teria de atravessar antes do radiotelescópio receber um sinal. Neste caso, o vento estelar influenciaria nas frequências do sinal de rádio. No entanto, não há sinais de tal efeito nos dados de rádio. Tudo indica que o misterioso objeto é um remanescente extremamente denso de uma estrela colapsada: um buraco negro ou outra estrela de nêutrons que não emite ondas de rádio. 

A procura por pistas continua: os astrônomos não só deduziram a órbita a partir das medições das diferenças de velocidade do "relógio" do pulsar, como também reduziram a massa do segundo objeto até 2,09 a 2,71 massas solares. Isto significa que a companheira pode ser mais massiva do que as estrelas de nêutrons mais pesadas conhecidas (cerca de duas massas solares) e, ao mesmo tempo, mais leve do que os buracos negros mais leves conhecidos (cerca de cinco massas solares). A razão pela qual ainda não foi encontrado nenhum outro objeto compacto entre duas e cinco massas solares não é totalmente compreendida.

As estrelas de nêutrons, os remanescentes ultradensos das explosões de supernovas, só podem ter até uma determinada massa. Quando ganham demasiada massa, talvez por consumirem outra estrela ou por colidirem com um objeto do mesmo tipo, entram em colapso. Qual exatamente o objeto resultante, após o colapso, é motivo de muita especulação, tendo sido propostos vários cenários de estrelas exóticas. A opinião predominante, no entanto, é que as estrelas de nêutrons colapsam para se tornarem buracos negros, objetos gravitacionalmente tão atrativos que nem a luz lhes consegue escapar. 

A teoria, apoiada pela observação, diz-nos que os buracos negros mais leves que podem ser criados por estrelas colapsadas são cerca de 5 vezes mais massivos do que o Sol. Isto é consideravelmente mais do que as 2,2 massas solares necessárias para o colapso de uma estrela de nêutrons, dando origem ao que é conhecido como a lacuna de massa dos buracos negros. A natureza dos objetos compactos, nesta gama de massas, é desconhecida e o estudo detalhado tem-se revelado até agora um desafio, uma vez que apenas vislumbres fugazes de tais objetos foram captados em observações das ondas gravitacionais produzidas por eventos de fusão no Universo distante. 

Embora a equipe não possa dizer de forma conclusiva se descobriu a estrela de nêutrons mais massiva que se conhece, o buraco negro mais leve que se conhece ou até mesmo uma nova e exótica variante estelar, o que é certo é que descobriu um laboratório único para investigar as propriedades da matéria sob as condições mais extremas do Universo.

Um artigo foi publicado na revista Science.

Fonte: Max Planck Institute for Radio Astronomy

Detectado o buraco negro mais antigo

Astrônomos descobriram o buraco negro mais antigo alguma vez já observado, que remonta aos primórdios do Universo, e verificaram que está englobando até à morte a galáxia que o hospeda.

© P. Oesch (galáxia GN-z11)

A equipe internacional, liderada pela Universidade de Cambridge, utilizou o telescópio espacial James Webb para detectar o buraco negro, que remonta a 400 milhões de anos após o Big Bang, ou seja, há mais de 13 bilhões de anos. 

O fato deste buraco negro surpreendentemente massivo - com alguns milhões de vezes a massa do nosso Sol - existir tão cedo no Universo desafia os nossos pressupostos sobre a forma como os buracos negros se formam e crescem. Os astrônomos pensam que os buracos negros supermassivos, que se encontram no centro de galáxias como a Via Láctea, cresceram até ao seu tamanho atual ao longo de bilhões de anos. Mas o tamanho deste buraco negro recém-descoberto sugere que podem formar-se de outras maneiras: podem "nascer grandes" ou podem "comer" matéria a um ritmo cinco vezes superior ao que se pensava ser possível. 

De acordo com os modelos padrão, os buracos negros supermassivos formam-se a partir dos remanescentes de estrelas mortas, que colapsam e podem formar um buraco negro com cerca de cem vezes a massa do Sol. Se crescesse da forma esperada, este objeto recém-detectado demoraria cerca de um bilhão de anos para atingir a dimensão observada. No entanto, o Universo ainda não tinha esta idade quando foi detectado. 

Como todos os buracos negros, este está devorando material da sua galáxia hospedeira a fim de favorecer o seu crescimento. No entanto, com muito mais vigor do que os seus irmãos em épocas posteriores. A jovem galáxia hospedeira, chamada GN-z11, brilha devido ao buraco negro incrivelmente energético no seu centro.

Os buracos negros não podem ser observados diretamente, mas são detectados pelo brilho revelador de um disco de acreção rodopiante, que se forma perto da orla de um buraco negro. O gás no disco de acreção torna-se extremamente quente e começa a brilhar e a irradiar energia na região do ultravioleta. Este forte brilho é a forma como os astrônomos conseguem detectar os buracos negros. 

GN-z11 é uma galáxia compacta, cerca de cem vezes mrnor do que a Via Láctea, mas o buraco negro está provavelmente prejudicando o seu desenvolvimento. Quando os buracos negros consomem demasiado gás, também o empurram para longe como um "vento" ultrarrápido. Este "vento" pode parar o processo de formação estelar, cessando lentamente a existência da galáxia, mas também matará o próprio buraco negro, uma vez que lhe cortará a fonte de suprimento.

Um artigo foi publicado na revista Nature

Fonte: University of Cambridge