quinta-feira, 1 de março de 2018

Hubble fornece evidências de uma nova física no Universo

Os astrônomos através do telescópio espacial Hubble efetuaram as medições mais precisas da taxa de expansão do Universo desde que foi calculada pela primeira vez há quase um século. Curiosamente, os resultados induz considerar que podem haver evidências de algo inesperado operando no Universo.

NGC 3972 e NGC 1015

© STScI/A. Riess (NGC 3972 e NGC 1015)

Estas imagens do telescópio espacial Hubble mostram duas das 19 galáxias analisadas num projeto para melhorar a precisão da taxa de expansão do Universo, um valor conhecido como a constante de Hubble. As composições a cores mostram NGC 3972 (esquerda) e NGC 1015 (direita), localizadas a 65 e 118 milhões de anos-luz, respetivamente. Os círculos amarelos em cada galáxia representam as localizações de estrelas pulsantes chamadas variáveis Cefeidas.

Isto porque a descoberta mais recente do Hubble confirma uma discrepância incômoda que mostra que o Universo parece estar se expandindo mais depressa, agora, do que era esperado dada a sua trajetória vista pouco depois do Big Bang. Os pesquisadores sugerem que pode ser necessária uma nova física para explicar a inconsistência.

"A comunidade está realmente lutando para compreender o significado desta discrepância," realça Adam Riess, do STScI (Space Telescope Science Institute) e da Universidade Johns Hopkins.

A equipe de Riess vem usando o Hubble ao longo dos últimos seis anos para refinar as medições das distâncias a galáxias, com auxílio das suas estrelas como marcadores. Estas medições são usadas para calcular quão rápido o Universo se expande com o tempo, um valor conhecido como a constante de Hubble. O novo estudo da equipe estica o número de estrelas analisadas até 10 vezes a distância dos resultados anteriores do Hubble.

Mas o valor de Riess reforça a disparidade com o valor esperado e derivado das observações da expansão do Universo inicial, 378.000 anos após o Big Bang, o evento violento que formou o Universo há aproximadamente 13,8 bilhões de anos. Estas medições foram feitas pelo satélite Planck da ESA, que mapeia o fundo cósmico de micro-ondas, uma relíquia do Big Bang. A diferença entre estes dois valores é aproximadamente de 9%. As novas medições do Hubble ajudam a reduzir as hipóteses de que a discrepância entre os dois valores é mera coincidência para 1 em 5.000.

O resultado do Planck previa que o valor da constante de Hubble deveria agora ser de 67 quilômetros por segundo por megaparsec (3,3 milhões de anos-luz), e que não podia ser superior a 69 quilômetros por segundo por megaparsec. Isto significa que por cada 3,3 milhões de anos-luz que uma galáxia está de nós, move-se 67 km/s mais depressa. Mas a equipe de Riess mediu um valor de 73 km/s/Mpc, indicando que as galáxias se movem a um ritmo mais rápido do que o implícito nas observações do Universo inicial.

Os dados do Hubble são tão precisos que não é possível descartar a diferença entre os dois resultados como erros em qualquer medição única ou método. "Ambos os resultados foram testados de várias formas, assim que a não ser que existam uma série de erros não relacionados, mas deve ser uma característica do Universo," explica Riess.

Riess delineou algumas explicações possíveis para esta discrepância, todas relacionadas com os 95% do Universo que está envolto em escuridão. Uma possibilidade é que a energia escura, já conhecida por acelerar o cosmos, pode estar afastando as galáxias umas das outras com uma força ainda maior, ou crescente. Isto significa que a própria aceleração pode não ter um valor constante no Universo, mas mudar ao longo do tempo do Universo. Riess partilhou o Prêmio Nobel pela descoberta, em 1998, da aceleração do Universo.

Outra ideia é que o Universo contém uma nova partícula subatômica que viaja perto da velocidade da luz. Estas velozes partículas são coletivamente chamadas "radiação escura" e incluem partículas anteriormente conhecidas como os neutrinos, criados em reações nucleares e decaimentos radioativos. Ao contrário de um neutrino normal, que interage por força subatômica, esta nova partícula só seria afetada pela gravidade e é apelidada de "neutrino estéril."

Ainda outra possibilidade fascinante é que a matéria escura (uma forma invisível de matéria não composta por prótons, nêutrons e elétrons) interage mais fortemente com a matéria normal ou com a radiação do que se julgava anteriormente.

Qualquer um destes cenários mudaria os conteúdos do Universo inicial, levando a inconsistências nos modelos teóricos. Estas inconsistências resultariam num valor incorreto para a constante de Hubble, inferido a partir de observações do cosmos jovem. Este valor seria então incompatível com o número derivado das observações do Hubble.

Riess e colegas não têm ainda quaisquer respostas para este problema vexante, mas a sua equipe continuará trabalhando no ajuste da taxa de expansão do Universo. Até agora, a equipe de Riess, de nome SH0ES (Supernova H0 for the Equation of State), diminuiu a incerteza para 2,3%. Antes do Hubble ter sido lançado em 1990, as estimativas da constante de Hubble variavam por um fator de dois. Um dos objetivos principais do Hubble era o de ajudar os astrônomos a reduzir o valor desta incerteza até um erro de apenas 10%. Desde 2005, o grupo tem procurado aprimorar a precisão da constante de Hubble até que permita uma melhor compreensão do comportamento do Universo.

A equipe conseguiu refinar o valor da constante de Hubble otimizando e fortalecendo a construção da escada de distâncias cósmicas, que os astrônomos usam para medir distâncias precisas de galáxias próximas e distantes. Os pesquisadores compararam estas distâncias com a expansão do espaço, conforme medido pela dilatação da luz de galáxias cada vez mais distantes. Usaram então a aparente velocidade externa das galáxias a cada distância para calcular a constante de Hubble.

Mas o valor da constante de Hubble só é tão preciso quanto a precisão das medições. Os astrônomos selecionaram classes especiais de estrelas e supernovas como "marcadores cósmicos" para medir com precisão as distâncias das galáxias.

Entre as mais confiáveis para distâncias menores estão as variáveis Cefeidas, estrelas pulsantes que aumentam e diminuem de brilho a ritmos que correspondem ao seu brilho intrínseco. As suas distâncias, portanto, podem ser inferidas através da comparação do seu brilho intrínseco com o seu brilho aparente visto da Terra.

A astrônoma Henrietta Leavitt foi a primeira a reconhecer a utilidade das variáveis Cefeidas para medir distâncias em 1913. Mas o primeiro passo é medir as distâncias às Cefeidas independentemente do seu brilho, usando uma ferramenta básica de geometria chamada paralaxe. A paralaxe é a mudança aparente na posição de um objeto devido a uma alteração do ponto de vista de um observador. Esta técnica foi inventada pelos antigos Gregos que a usaram para medir a distância da Terra à Lua.

O resultado mais recente do Hubble é baseado em medições da paralaxe de oito Cefeidas recém-analisadas na nossa Via Láctea. Estas estrelas estão cerca de 10 vezes mais distantes do que as estudadas anteriormente, residindo entre 6.000 e 12.000 anos-luz da Terra, o que as torna mais difíceis de medir. Pulsam a intervalos mais longos, tal como as Cefeidas observadas pelo Hubble em galáxias distantes que contêm outra "régua" confiável, explosões estelares chamadas supernovas do Tipo Ia. Este tipo de supernova explode com um brilho uniforme e é brilhante o suficiente para ser observado relativamente longe. As observações anteriores do Hubble estudaram 10 cefeidas que piscam mais depressa localizadas de 300 a 1.600 anos-luz da Terra.

Para medir a paralaxe com o Hubble, a equipe teve que avaliar a pequena, mas aparente oscilação das Cefeidas devido ao movimento da Terra em torno do Sol. Estas oscilações têm aproximadamente 1/100 do tamanho de um único pixel na câmara do telescópio, equivalentes ao tamanho aparente de um grão de areia a 160,9 km de distância.

Portanto, para garantir a precisão das medições foi desenvolvido um método inteligente que não tinha sido previsto durante o lançamento do Hubble. Os cientistas inventaram uma técnica de varrimento na qual o telescópio media a posição de uma estrela mil vezes por minuto a cada seis meses durante quatro anos.

A equipe calibrou o brilho verdadeiro das oito estrelas que pulsam lentamente e cruzou-as com as suas primas mais distantes a fim de encolher as imprecisões na sua escada de distâncias. Os inpesquisadores compararam então o brilho das Cefeidas e das supernovas nestas galáxias com maior confiança, para que pudessem medir com mais firmeza o brilho verdadeiro das estrelas e, portanto, calcular distâncias de centenas de supernovas em galáxias distantes com maior precisão.

Outra vantagem deste estudo é o uso do mesmo instrumento, o WFC3 (Wide Field Camera 3) do Hubble, para calibrar as luminosidades tanto das Cefeidas próximas como daquelas em outras galáxias, eliminando os erros sistemáticos que são inevitavelmente introduzidos quando comparando medições obtidas por diferentes telescópios.

Normalmente, se a cada seis meses quando é medida a mudança na posição de uma estrela em relação a uma segunda a estas distâncias, há uma limitação da capacidade em descobrir exatamente onde está a estrela. Usando a nova técnica, o Hubble move-se lentamente através de um alvo estelar e capta a imagem como uma linha de luz. "Este método permite oportunidades repetidas para medir os deslocamentos extremamente pequenos devido à paralaxe. Estamos medindo a separação entre duas estrelas, não apenas num local na câmara, mas repetidamente durante milhares de vezes, reduzindo os erros nas medições," acrescenta Riess.

O objetivo da equipe é reduzir ainda mais a incerteza usando dados do Hubble e do observatório espacial Gaia da ESA, que irá medir as posições e distâncias de estrelas com uma precisão sem precedentes. Esta precisão será necessária para diagnosticar a causa desta discrepância.

Os resultados foram aceitos para publicação na revista The Astrophysical Journal.

Fonte: Space Telescope Science Institute

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